GERARDO MANUEL & HUMO – APOCALLYPSIS (1970)

 

    Escutando duas raridades do combo Gerardo Manuel & Humo. Trupe peruana formada no início dos anos 70, sua música era uma mistura de hard rock e psicodelia com fortes influências de Jimi Hendrix Experience e Grand Funk Railroad, perceptíveis principalmente em seu disco de estréia.

 

    O agrupamento era capitaneado por ninguém menos que Gerardo Rojas, ícone local e considerado o grande responsável pela evolução do rock em seu país. Esse ideal, aliás, começou a tomar forma ainda nos anos 60, quando o cantor e compositor peruano mostrou o caminho das pedras à frente de bandas pioneiras no estilo como Los Doltons e Los Shains. Quando em 1970 foi contratado para atuar como executivo da gravadora “El Virrey”, mudou seu nome artístico para Jorge Gerardo Manuel e fundou o Humo, gravando três discos altamente recomendados.

 

    A estréia veio no mesmo ano com o lançamento do LP Apocallypsis, considerado o primeiro registro de hard rock em terras peruanas. Para esta tarefa, foram chamados outros três músicos conhecidos da cena local: Jorge “Coco” Pomar (baixo e guitarra acústica), Freddy “Puro” Fuentes (bateria e percussão) e Enrique “Pico” Ego Aguirre (guitarras e órgão), ex-membro e companheiro de Gerardo no Los Shains e que aqui, assina com o  pseudônimo de Enrique Mario. Um quarteto libertário e transformador que respirava a atmosfera da contracultura, pregando o ideário “peace and love”.

 

 

    O álbum é um arraso e já começa surpreendendo com a profética “Apocallypsis (Beginning & End)”, nada mais que um presságio do fim dos tempos, embalado por riffs e timbres apoteóticos. “Looking For Tomorrow” expõe riffs de guitarra e linhas de baixo que lembram o bom e velho Black Sabbath. “Where Did You Go? é um hard com solos ácidos e belos fraseados de guitarra, com a seção rítmica funcionando a todo vapor.

 

    O disco traz não só composições próprias como covers matadoras de Grand Funk (“Are You Ready”) e Jimi Hendrix (“Power To Soul”), mantendo o peso e o suingue das versões originais. Em “Rock & Roll Soul” a banda presta tributo a Elvis Presley, acelerando um rock’n’roll de 1000 cilindradas. Outra homenagem escancarada está na faixa “I Can Do It, If You Do It”, que pega carona nas baladas stonianas, com Gerardo Manuel emitindo um timbre vocal que lembra o de Mick Jagger. Demais!

 

    Em algumas faixas o órgão Hammond (tocado por Enrique Aguirre) passeia com maestria pelos arranjos, aumentando a carga lisérgica das canções como mostra a bela “96 tears”. Outros destaques são as faixas “Lonely Night” (com guitarras e teclados hipnóticos e solo de batera de Fuentes)  e “(I Will Bring You) Flowers In The Morning” (que inclui um arranjo de cordas para acabar o mundo).

 

    Em 2005, Apocallypsis foi editado em formato digital (com 4 faixas bônus e encarte com fotos e letras) em meio às comemorações de seu 35º aniversario de lançamento. Obscuridade para ser escutada no dia do Juízo Final!  

 

Faixas: 01. Apocallypsis (Beginning & End) / 02. Are You Ready? / 03. Looking for Tomorrow / 04. Lonely Night / 05. Power of Soul / 06. ( I Will Bring You ) Flowers In The Morning / 07. Where Did You Go? / 08. Rock & Roll Soul / 09. I Can Do It, If You Do It / 10. 96 Tears / Bônus: 11. Gotas de lluvia siguen cayendo sobre mi cabeza / 12. Where Did You Go? (version 45rpm) / 13. Looky Looky / 14. Anoche No Dormi

 

GERARDO MANUEL & HUMO – LOOKING FOR TOMORROW

 

GERARDO MANUEL & HUMO – POWER OF SOUL

GERARDO MANUEL & HUMO – (I WILL BRING YOU) FLOWERS IN THE MORNING

GERARDO MANUEL & HUMO – WHERE DID YOU GO?

GERARDO MANUEL & HUMO – ROCK & ROLL SOUL

GERARDO MANUEL & HUMO – MACHU PICCHU 2000 (1971)

 

    Outra pérola lançada pelo grupo é este Machu Picchu 2000, de 1971, que chega a ser tão surpreendente e admirável quanto o antecessor. Flertando com elementos da psicodelia e do blues, a banda constrói um clima predominantemente acústico, com belas canções de aura hippie e espírito cigano. Apenas composições próprias e letras que instigam a uma utópica paz no planeta. Um trabalho mais maduro, onde o grupo desenvolve uma sonoridade com menos peso, mas com arranjos mais originais e criativos.

 

    Músicos se revezando nos instrumentos e conduzindo uma seção rítmica com tempero andino. Além dos remanescentes Gerardo Manuel e Jorge Pomar, outras feras participam da gravação: Ernesto Samame (guitarras e teclados), Juan Carlos Barreda (baixo), “Oso” Torres (baixo), “Chacal” Allison (bateria), Rafa “Pocho” Purizaga (piano, vibrafone, guitarra acústica e baixo), Joey Vargas (piano e flauta), Alberto “Al” Lozano (percussão), Ronald Ferreccio (saxofone), Calixto (trombone) e Ehitel Silva (trompete).

 

    Em faixas como “Machu Picchu Blues” (com canja do guitarrista e compositor peruano Zellon Richie, ex-membro do El Ayllu) e “Mundos extraños”, são agregados instrumentos como flauta, sax e trompete, encorpando delicadamente os arranjos das canções. A bela “Hey españoles, no escuchan el lamento de los Incas?” é uma das prediletas e traz letra revolucionária, acompanhada de um trabalho instrumental brilhante.

 

  

    Em meio a sutilezas como “Hacia donde van?” e “Perdidos”, a banda pega pesado apenas na derradeira faixa “Diciembre 31 – 1999”, onde um rock vigoroso e sobrecarregado de guitarras fuzz é interrompido com a explosão de uma bomba atômica. É o cataclisma sonoro nuclear anunciando o fim… de um belo disco. Muy Bueno!

 

    Existe ainda um terceiro e último lp da trupe intitulado Quién es el Mayor?, mantendo a vibe psicodélica, mas com influências mais próximas do rock progressivo. Este disco ainda não achei nos sebos, mas a busca continuará…. Nunca é tarde para lembrar que os lps originais custam o preço da alma. Se você achar os relançamentos em vinil por menos de 250 reais, considere-se um cara de sorte.

 

    Hoje em dia, Gerardo Manuel é reconhecido em seu país não só pelo seu pioneirismo no rock local como também por ter sido o apresentador do cultuado Disco Club, um programa televisivo que durante 25 anos trouxe as novidades do rock nacional e internacional aos ouvintes peruanos. Em 2004, para celebrar seus 40 anos de vida artística, se reuniu com os membros originais do Los Shains e juntos, realizaram alguns shows após um recesso de 35 anos. Atualmente, Gerardo pode ser visto realizando concertos com o Humo e, ocasionalmente, com os Los Shains. Os peruanos agradecem… 

 

    Combos como Gerardo Manuel & Humo e o excelente Pax (banda formada por Enrique Aguirre logo após a sua saída do Humo. O disco Dark Rose é outra maravilha do hard rock local e conta com a participação de Gerardo em uma das faixas) foram os bons indícios que me fizeram garimpar o desconhecido universo do rock peruano dos anos 60 e 70. A partir daí, descobri outras agremiações como Los Belking’s, Tarkus, Telegraph Avenue, El Ópio, Smog e Traffic Sound. Salve, salve a santa obscuridade musical.   

Faixas: 01. Machu Picchu Blues / 02. Perdidos / 03. Hey españoles, no escuchan el lamento de los Incas? / 04. La leyenda del lago / 05. Punto y aparte / 06. Madre tierra / 07. Mundos extraños / 08. Hacia donde van? / 09. Diciembre 31 -1999 

GERARDO MANUEL & HUMO – MACHU PICCHU BLUES