PINK FAIRIES – NEVER NEVER LAND (1971)

    Formado em 1970 e punk antes do tempo, o Pink Fairies foi um dos mais ativos grupos da cena underground de Londres, ao lado de conterrâneos como Hawkwind e Edgar Broughton Band. A formação inicial era composta pelo canadense Paul Rudolph (guitarra e vocais), Duncan Sanderson (baixo) e Russell Hunter (bateria) – todos ex-integrantes doThe Deviants, um combo anárquico inglês liderado pelo músico e jornalista Mick Farren. Completava o quarteto o baterista e vocalista John Alder, mais conhecido como Twink, e que já havia tocado nas bandas Tomorrow e Pretty Things. A fase áurea da banda está registrada nos três discos de estúdio gravados na década de 70 e lançados pela Polydor Records.

 

    O debut é justamente este Never Never Land de 1971 e que vinha embalado em uma capa maravilhosa – um desenho que ilustra os quatro integrantes da banda, representados por quatro gnomos sentados no topo de um planeta, observando o espaço sideral. Em vinil é coisa linda! O design do álbum é uma contribuição da dupla Pennie Smith e Tony Vesely. Com produção conjunta dos Fairies e Neil Slaven, o disco obteve excelente recepção dentro do circuito alternativo, sendo aclamado não só por universitários londrinos, como também por hippies e junkies de plantão, que automaticamente se identificaram com o espírito freak do quarteto. No entanto, a banda nunca alcançou as grandes massas e com o passar dos anos, a sua música foi jogada no pântano das obscuridades musicais.

 

    Sonzeira mesclando toques ácidos de psicodelia com um hard rock vigoroso, vocais rudes e um instrumental arrojado, sujo e malvado, com direito a riffs ganchudos e climas viajantes em algumas das canções. A viagem sonora começa em clima acústico (na versão em vinil) com a introdução de “Do It”mas o tema logo descamba para um som agressivo, com solos de guitarra chapantes a cargo de Paul Rudolph. Um clássico da banda que proclama a anarquia ampla, geral e irrestrita e que inspirou uma geração de ícones do punk rock – entre eles, John Lydon do Sex Pistols. 

 

Pink Fairies em 1970: anarquizando a cena underground de Londres

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    Outros petardos são as faixas “Say You Love Me” (um energético hard rock conduzido por uma guitarra de timbre sujo e selvagem), “Teenage Rebel” (seção rítmica acelerada, com direito a guitarras nervosas e solo de batera no final) e a fantástica “Uncle Harry’s Last Freak-Out”, trazendo mais de 10 minutos de embate sonoro com guitarras distorcidas e efeitos wah-wah. Uma pegada que lembra o som visceral produzido em Detroit por bandas como Stooges e MC5. 

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    Há espaço também para climas de calmaria lisérgica como mostram as faixas “Heavenly Man” (impossível não associar esse som com aquele praticado pelo Pink Floyd), “War Girl” (composição avassaladora, moldando uma atmosfera cósmica com ecos de “Black Magic Woman” de Peter Green), “Track One, Side Two”, “Never Never Land” e The Dream Is Just Beginning”, todas com belos instrumentais.

 

    Uma ótima estréia, remasterizada e lançada em formato digital, com 4 ou 6 músicas adicionais, dependendo da edição. Além do vinil, tenho uma versão inglesa em cd (tiragem de 500 cópias) com 6 faixas bônus. Destaques para o single “The Snake” (que foi lançado em compacto junto com “Do It” antes da estréia em LP e, inexplicavelmente, subtraído da edição original), “People Call You Crazy” (que trama uma levada de harmônica e vocal com resquícios de Captain Beefhearth) e a maravilhosa “Trouble Coming Everyday”, que segue o rastro de “Trouble Every Day” de Frank Zappa – certamente, uma das influências da trupe. Enfim, um play que não pode faltar em nenhuma coleção que se preze.

 

Faixas: 01. Do It / 02. Heavenly Man / 03. Say You Love Me / 04. War Girl / 05. Never Never Land / 06. Track One, Side Two / 07. Thor / 08. Teenage Rebel / 09. Uncle Harry’s Last Freak-Out / 10. The Dream Is Just Beginning / Bônus: 11. The Snake (Single Version) / 12. Well, Well, Well / 13. Trouble Coming Everyday / 14. Broken Statue / 15. People Call You Crazy / 16. Do It (Single Version)

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PINK FAIRIES – DO IT

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PINK FAIRIES – HEAVENLY MAN

PINK FAIRIES – SAY YOU LOVE ME

PINK FAIRIES – WAR GIRL

PINK FAIRIES – NEVER NEVER LAND

PINK FAIRIES – TRACK ONE, SIDE TWO

PINK FAIRIES – THOR

PINK FAIRIES – UNCLE HARRY’S LAST FREAK-OUT

PINK FAIRIES – THE DREAM IS JUST BEGINNING

PINK FAIRIES – THE SNAKE

PINK FAIRIES – BROKEN STATUE

PINK FAIRIES –  MARCHING DRUM BAND (1971)

PINK FAIRIES – WHAT A BUNCH OF SWEETIES (1972)

    Logo após a gravação do primeiro álbum, o Pink Fairies participou do festival Glastonbury, em junho de 1971, com um elenco formado por David Bowie, Gong, Quintessence, Melanie, The Edgar Broughton Band, Terry Reid, Traffic, Hawkwind, Arthur Brown, Brinsley Schwarz, Fairport Convention e Family. Em 1972, o músico Twink resolve abandonar a banda para formar o obscuro Stars ao lado de ninguém menos que Syd Barrett, ex-líder do Pink Floyd. Um projeto que depois de poucas apresentações, logo foi abortado.

 

    No mesmo ano era lançado o LP What a Bunch of Sweeties, segundo registro dos Fairies, contando com a força do trio remanescente (Paul, Sandy e Russell) e mais a participação do guitarrista Trevor Burton (ex-The Move) nas faixas “Right On, Fight On” e “Portobello Shuffle”. Dos três discos gravados em estúdio na década de 70, este talvez seja o mais desconhecido da trupe. Eu mesmo só consegui o vinil há pouco tempo e confesso que ainda estou absorvendo o espírito freak da gravação. Mas já deu para perceber que a sonoridade agressiva, dinâmica e divinamente tosca, permanece a milhão.

 

    Nada mais que uma odisséia pelas vias da anarquia sonora, letras sacanas, levadas quase heavy e total apologia às drogas. A foto de capa mostra uma coleção lisérgica, reunindo bottons de diversas bandas (Grateful Dead, Canned Heat, Jimi Hendrix Experience…), várias insígnias (em uma delas lê-se “Eu sou um inimigo do Estado”), cachimbos artesanais para fumar maconha, muitas pílulas, comprimidos, bugigangas e um baseado no meio disso tudo. Junkie total!

 

    A capa interna contém uma história em quadrinhos absolutamente freak – uma espécie de conto hippie acerca da natureza, envolvendo bichos e frutas, onde os membros da banda são apresentados como animais-músicos. Bizarro! A arte gráfica e as fotos do álbum, ficam por conta de Edward Barker e Pennie Smith – para quem não sabe, a mesma fotógrafa que clicou Paul Simonon estraçalhando seu baixo elétrico durante um show da banda britânica de punk rock The Clash. A foto está imortalizada na capa do lendário álbum London Calling.

 

O guitarrista Paul Rudolph nos tempos de Pink Fairies 

 

    What a Bunch of Sweeties em sua edição original, trazia 8 faixas adrenalíticas, imundice sonora escorrendo pelos sulcos do vinil e produção tosca com assinatura da banda. O álbum começa com um telefonema enigmático, servindo de introdução para o peso e a psicodelia de “Right On, Fight On”que emana timbres e solos guitarrísticos faiscantes. Outras cacetadas sonoras são “Portobello Shuffle” (hard-rock sensacional e guitarra com timbres de outro planeta) e “Marilyn” (com solos insanos de batera e guitarra, detonando uma explosão de decibéis).

 

    Tem ainda “The Pigs of Uranus”, cuja letra foi retirada de uma HQ do cartunista americano Gilbert Shelton, criador dos lendários Freak Brothers. Um raro momento country rock dos Fairies, que parecem tocar seus instrumentos diretamente de uma fazenda de outra galáxia. “I Went Up, I Went Down” é a única balada do disco e chega para dar uma tranqüilizada no ambiente sonoro. “X-Ray” traz um ritmo mais funkeado, temperado com guitarras wah-wah e uma cozinha consistente.

 

    Outros destaques são as versões para “I Saw Her Standing There” dos Beatles (onde é dado um tratamento quase New York Dolls à canção, com muito peso e guitarras distorcidas) e “Walk Don’t Run” dos Ventures (um clássico revisitado de forma surpreendente, com seus 9 minutos de instrumental insano, guitarras saturadas e condução rítmica acelerada). Um disco com uma dose generosa de humor nas composições e muita vitalidade nas instrumentações.  

 

Faixas: 01. Right On, Fight On / 02. Portobello Shuffle / 03. Marilyn / 04. The Pigs of Uranus / 05. Walk Don’t Run / 06. I Went Up, I Went Down / 07. X-Ray / 08. I Saw Her Standing There / Bônus: 09. Going Down / 10. Going Down (Previously Unreleased) / 11. Walk Don’t Run (First Version)

 

PINK FAIRIES – RIGHT ON, FIGHT ON

 

 

PINK FAIRIES – PORTOBELLO SHUFFLE

 

PINK FAIRIES – MARILYN

PINK FAIRIES – WALK DON’T RUN

PINK FAIRIES – I WENT UP, I WENT DOWN

PINK FAIRIES – X-RAY

PINK FAIRIES – I SAW HER STANDING THERE

PINK FAIRIES – GOING DOWN

PINK FAIRIES – KINGS OF OBLIVION (1973)

    Após o lançamento do segundo LP do Pink Fairies, o guitarrista Paul Rudolph decidiu se afastar da banda. Segundo consta, sua saída teria sido motivada por causa do consumo excessivo de LSD por parte de Russell e Sanderson e que, segundo ele, estaria prejudicando os rumos da banda. Rudolph passou então a colaborar em álbuns de Robert Calvert, substituiu o baixista Lemmy Kilmister no Hawkwind entre 1975 e 1976 e participou de quatro LPs de Brian Eno entre 1974 e 1978, antes de abandonar a carreira e voltar para o Canadá.  

 

    Para o seu posto foi convocado o guitarrista Mick Wayne, ex-integrante das bandas The Bunch of Fives eJunior’s Eyes, e que vinha de trabalhos com David Bowie. Depois de duas apresentações e de uma gravação que gerou dois singles (“Well, Well, Well” e “Hold On”), Wayne acabou sendo demitido por Russell e Sandy. O motivo: discordâncias com relação a direção musical que Wayne queria impor ao grupo. Larry Wallis (ex- Shagrat, Blodwyn Pig e UFO), que já havia sido contratado como segundo guitarrista da banda, assume então a linha de frente dos Fairies, como guitarrista e vocalista demencial.

 

    Com o power-trio Wallis, Russell e Sandy, partiram para as gravações do sensacional Kings of Oblivion, terceiro disco dos maluquetes e considerado por muitos fãs como o melhor álbum do grupo. Lançado em 1973, trazia mais uma capa de encher os olhos: um fundo azul com três porcos rosas voadores, usando óculos escuros. A ilustração de Edward Barker, acabou virando uma espécie de símbolo da banda, já que o porco voador passou a freqüentar cartazes de shows e outras capas de discos da turma. Mesmo com a alteração no line-up, o Pink Fairies seguia a sua ideologia contracultural, promovendo a música livre, a anarquia geral, a contestação social, o consumo de drogas e os shows alternativos – alguns deles, realizados em verdadeiras pocilgas.

 

    Musicalmente falando, o disco é uma porrada sonora das boas, comandada por um power trio da pesada, que manda ver no mais descarado e alucinado hard rock. Larry Wallis além de excelente guitarrista, trouxe na bagagem um punhado de boas composições e um estilo vocal primitivo e peculiar que encaixou muito bem com a cozinha pervertida de Duncan Sanderson e Russell Hunter. Resultado: a sonoridade que já era suja e visceral, ficou ainda mais podre e próxima daquela empregada por grupos do chamado proto-punk, como Stooges, MC5 e New York Dolls. 

 

Larry Wallis apostando suas fichas no Pink Fairies  

    O disco abre com um dos hinos libertários do grupo, a fantástica “City Kids”, em um desempenho marcante de Wallis, tanto no vocal rude quanto na guitarra raivosa. As bases sonoras serviriam para futuras “maquinações heavy”, inspirando descendentes diretos da estirpe, como o próprio Motörhead – banda que Wallis viria a participar entre 1975 e 1976, em sua primeira encarnação. “I Wish I Was A Girl” surpreende e cativa com suas reverberações e escalas guitarrísticas sensacionais. Obra de Wallis, que constrói uma parede sonora envolvente, dando brechas para as experimentações. “When’s the Fun Begin?”, tema composto porWallis e Mick Farren, encerra o lado A do vinil com um arranjo denso e pesado, made subúrbio londrino. 

    “Chromium Plating” é outra maravilha selvagem e se destaca pelas belas passagens de guitarra e auxílio luxuoso da cozinha que mantém uma pegada agressiva. “Raceway” dispara um tema instrumental vigoroso, com batera e baixo fornecendo sólida base rítmica para a guitarra de Wallis injetar riffs matadores. A machista “Chambermaid” tem letra sacana que envolve arrumadeiras de hotéis, servindo de munição para mais um instrumental cru e energético. E “Street Urchin” fecha a bolacha, com nova leva de riffs ruidosos e excelente trabalho do trio, constatando o entrosamento e a unidade sonora dos Fairies. Sem dúvidas, um dos maiores expoentes do rock underground dos anos 70. 

     Com o fim do contrato com a Polydor, a banda foi aos poucos perdendo a audiência e seus membros se dispersando. Para reagrupar a trupe, Ted Carroll (chefe da Chiswick Records) organizou um concerto único no The Roundhouse, em Londres, em meados de 1975. Estavam lá Paul Rudolph, Larry Wallis, Duncan Sanderson, Russell Hunter e Twink. O show foi lançado em disco em 1982 e saiu com o título de Live At The Roundhouse 1975. 

 

    Os anos passaram, mas tentativas frustradas de reativar a banda acabaram aumentando o seu período de inatividade. Os veteranos da banda finalmente conseguiram uma reaproximação em 1987, quando Twink, Russell, Sanderson, Wallis e Andy Colquhoun reformaram o Pink Fairies e gravaram o álbum Kill ‘Em and Eat ‘Em. Desde então, foram emitidos vários títulos de material ao vivo e coletâneas do grupo. Pérolas como Uncle Harry (1998), Do It! (1999) e Finland Freakout 1971 (2008) são altamente recomendadas. Sonzeira garantida!    

 

Faixas: 01. City Kids / 02. I Wish I Was a Girl / 03. When’s the Fun Begin? / 04. Chromium Plating / 05. Raceway / 06. Chambermaid / 07. Street Urchin / Bônus: 08. Well, Well, Well (Single Version) / 09. Hold On (Single Version) / 10. City Kids (Alternate Mix) / 11. Well, Well, Well (Alternate Version)

 

PINK FAIRIES – KINGS OF OBLIVION [álbum completo]

 

 

PINK FAIRIES – UNCLE HARRY’S LAST FREAK-OUT / CITY KIDS (1975)

 

 

PINK FAIRIES – I WISH I WAS A GIRL

 

PINK FAIRIES – WHEN’S THE FUN BEGIN?

PINK FAIRIES – CHROMIUM PLATING

PINK FAIRIES – RACEWAY

PINK FAIRIES – CHAMBERMAID

PINK FAIRIES – WELL, WELL, WELL

PINK FAIRIES – ROUNDHOUSE REUNION (1975)